- Juramento de Hipócrates -
"Eu, solenemente, juro consagrar minha vida a serviço da Humanidade. Darei como reconhecimento a meus mestres, meu respeito e minha gratidão. Praticarei a minha profissão com consciência e dignidade. A saúde dos meus pacientes será a minha primeira preocupação. Respeitarei os segredos a mim confiados. Manterei, a todo custo, no máximo possível, a honra e a tradição da profissão médica. Meus colegas serão meus irmãos. Não permitirei que concepções religiosas, nacionais, raciais, partidárias ou sociais intervenham entre meu dever e meus pacientes. Manterei o mais alto respeito pela vida humana, desde sua concepção. Mesmo sob ameaça, não usarei meu conhecimento médico em princípios contrários às leis da natureza. Faço estas promessas, solene e livremente, pela minha própria honra."
Há alguns dias perdemos uma colega, do dia pra noite. Começou com uma dor de cabeça, foi consultar e o médico diagnosticou enxaqueca (sem pedir nenhum exame) e mandou embora. Dois dias depois ela internou, entrou em coma e morreu. Em plena atividade na vida.
O que pensar destes profissionais da saúde? O que eles querem? Reclamam tanto que a profissão não deixa nenhum médico rico, mas porque então, fazem medicina? Com certeza não é pra seguir fielmente o juramento dito por eles quando se formam.
Infelizmente não consigo entender.
Há dois meses e meio meu filho teve outra crise da
anemia. Na época, passei muitos dias sem postar e nem comentei aqui por que esta foi uma das piores crises da vida dele e eu fiquei muito mal. Super pra baixo.
Alem de ser a pior crise, eu estava sozinha em casa. Meu marido tinha ido viajar exatamente naquele dia, me sentia completamente capenga.
Ele trabalhou o dia inteiro com dor e de noite depois de jantar, lá pelas 23h, a dor já era insuportável e decidimos chamar a SAMU. Só conseguimos ir pro hospital a uma e meia da madrugada porque implorei pra ambulância da SAMU nos levar. Eles carregam pacientes somente em estado gravíssimo, caso de vida ou morte, o que não era o caso do meu filho, apesar dele estar urrando de dor mesmo depois de ter tomado uma dose de morfina.
Com certeza o motorista e a enfermeira (não é nem o médico que vai até tua casa) ficaram com pena de nós, aí nos levaram.
Chegamos ao hospital no meio da noite, muito fria, fazia uns 5 graus e esperamos pelo atendimento que felizmente não demorou.
Enquanto ele aguardava em uma cadeira de rodas, depois de medicado, pois todos os leitos estavam ocupados, ele gemia e chorava de muita dor nas pernas. Não tinha acomodação que o fizessem melhorar.
Eu insistentemente corria atrás das enfermeiras pra dar remédio pra dor, mas nada adiantava, a dor desta vez foi insuportável.
Enquanto todos os pacientes estão ali sendo atendidos pelas enfermeiras, o médico, claro, vai deitar pra dormir e esperar pelo próximo paciente que chega pra ser avaliado e encaminhar pra medicação.
Eu, como não sei esperar enquanto o médico tira um cochilo (sou chata mesmo), vou atrás da enfermeira e insisto pra falar com ele. Ela com muita má vontade, depois de tanto eu insistir, vai chamá-lo.
Agora ele vê que ele realmente precisa de um atendimento mais eficaz, de um leito pra colocar aparelhos e monitorar os batimentos, respiração etc. São seis horas da manhã quando conseguimos isto.
As sete horas ligo pra médica dele e digo que estamos lá no hospital esperando por ela. Ela chega às oito trazendo um frio de 3 graus que faz lá fora. Não é muito bem quista por alguns mesmo sendo chefe da hematologia, pois já chega dando ordens e pedindo quase um atendimento especial pra ele.
Ela o trata desde pequeno e tem uma afeição especial por nós. Mais tarde chega a equipe da hematologia pra cuidar dele. Tenho alguns privilégios, pois conheço e tenho amizade com muita gente daquele hospital. Então uso meu QI (quem indica) pra que meu filho tenha um atendimento rápido e eficaz. Fico lá dentro daquela emergência lotada com ele, segurando sua mão e rezando pra que aquela dor passe o quanto antes. Desta vez estou um farrapo por dentro. Ele chora, grita e nenhum remédio que tome alivia as dores por mais de 20 minutos. Ele toma morfina, codeína e todas as inas possíveis e nada.
Meu Deus, desejo que tudo aquilo passe pra mim. Mordo o lábio, digo pra ele respirar, ter calma, não ficar tenso. Mas nada adianta. A dor é insuportável.
Saio do hospital no meio da tarde enquanto minha irmã ocupa meu lugar ao lado dele. Vou pra casa e tento descansar, dormir um pouco pra depois voltar. Mas quem disse que consigo? PQP!!!! Logo eu que sou tri dorminhoca, agora que preciso, não consigo. Só consigo chorar. Tento não chorar muito pra que ele não perceba, mas desta vez eu preciso, necessito morrer chorando. Tiro um cochilo e novamente volto ao hospital.
Fico até tarde da noite, saio sozinha pois meu marido ainda não voltou de viagem. Me sinto ainda mais sozinha.
Desta vez só eu e minha irmã revezamos as idas ao hospital. Não posso ficar o tempo todo porque também tenho que trabalhar e uma filha de oito anos em casa me esperando. Mas aproveito o privilégio de ter colegas, chefe e sogra que seguram as pontas pra mim.
Mas Deus nunca me abandona. Minha irmã trabalha neste hospital, eu conheço meio mundo lá dentro (mesmo tendo que correr atrás dos médicos o tempo TODO) e sem perder a fé em Deus.
Vou a igreja e rezo pra Santa Teresinha. Não é que somos abençoados mesmo? Todo dia 30 de cada mês tem uma missa especial em homenagem à ela. E adivinha que dia era este? Exatamente dia 30, dia de Santa Teresinha. Fico pra missa, rezo, choro, peço e imploro pra que a dor dele passe o quanto antes. Levo uma rosa pro hospital e na hora de ir embora, deixo a rosa com ele.
No outro dia quando volto, ele me diz: “Mãe, apaguei. Dormi a noite toda.”
Sim, eu tinha certeza de que ela me atenderia. Mas ele ainda continuava na emergência, com muita dor, misturado com um monte de pacientes amontoados, quase que todos ocupando um único e enorme leito.
E ainda quero o melhor pra ele e vou usar de toda minha influência e de meus amigos pra que ele saia dali, que vá pro quarto.
Durante alguns dias, falei com algumas pessoas influentes, amigos antigos, fui na ouvidoria mas nada ainda tinha sido feito.
Então em uma tarde, sentada na frente do computador no meu serviço, tive uma idéia luminosa.
Mandei um e-mail pro vice presidente do hospital, que foi meu chefe. Como não lembrei disto antes? Bom, não importa. Aquela era a hora.
Mandei. Não obtive resposta. Saio e vou até o hospital pra ficar com ele até à noite.
A médica da emergência me diz que ele terá alta no outro dia.
Como assim? Ele ainda está com dor, precisa de mais tempo aqui com certeza.
De novo, não aceito qualquer decisão que não seja a melhor pra ele.
Vou atrás do médico dele.
Quando o encontro ele me diz: “Pois é, hoje o Marlon já está indo pro quarto. A Dra. Lucia acabou de receber uma ligação do vice presidente e ele vai internar, já tem leito pra ele.”
Meu Deus! Ele me ouviu e atendeu meu pedido. Quase grito de alegria, mas me contenho.
Tá, quem aí não acredita na luta, na fé e perseverança?
Eu acredito. E corro atrás dela pra elas não esqueçam de mim.
Tudo certo. Internação, médicos no quarto, equipe da hematologia, equipe da dor, transfusão sanguínea, remédios, etc.
Tranqüilo. Agora vou pra casa um pouco mais descansada.
E tudo isto durou exatamente 12 dias. Correria, subindo e descendo escada, correndo atrás de médico, mandando e-mail pro vice presidente do hospital (e sendo atendida), trabalhando pingado, e muito, mas muito cansaço.
E novamente chego a conclusão de que consegui tudo isto depois de usar todos os meus QIs pra ele ser atendido como realmente merecia e como qualquer paciente deveria ser atendido e não é. Infelizmente.
Mas pra conseguir tudo isto, passei na frente de muita gente, furei a fila, usei e abusei de toda minha influência de amigos pra ter tudo o que eu queria e penso que isto nunca deveria ser assim, acho que todos os pacientes merecem tratamento igual, merecem respeito e ótimo atendimento médico. Mas infelizmente não é. Ao mesmo tempo em que me sentia aliviada por conseguir ver que todo meu esforço estava dando certo, me sentia mal também. Mal por saber que se tu conchece alguém, se tem influência seja lá em que área for, sempre há um jeitinho de conseguir as coisas. Eu usei e abusei pra ver tudo funcionar com o Marlon, era a saúde dele que estava em risco, mas e os outros pacientes? Quem cuida deles? Os médicos "hipocráticos"? Duvido.
Depois de alguns dias, passo um e-mail para o vice presidente do hospital agradecendo pela pronta ajuda que ele me deu e ele responde:
“Luisa, de que vale passar nesta vida sem afeto .......
Todos nós, e especialmente o Marlon, saímos melhores, não é mesmo?”
De quê vale?
Pra mim, de nada! Ainda bem que eu os conquistei e tenho como preciosidades em minha vida.
Mas e os outros
"dotô"? Precisam do afeto dos médicos também pra serem bem atendidos? É preciso incluir esta cadeira urgente na universidade.......... da vida.
E que da próxima vez, que a crise, que é inevitável, infelizmente, demore muito, mas muito tempo e que não seja tão longa, duradoura e dolorosa como foi esta. Ou que seja descoberta uma cura pra
Anemia Falciforme.